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quinta-feira, maio 19, 2011



CHUVA de Paula Hernández


De forma, que de tanto ensaiar e dar nome, vou tentar por agora, me deixar levar pelas sensações. Eu falei tanto de um texto não escrito. A expectativa também era minha antes de ontem pela madrugada. E ainda é, de fato, porque houve encantamento. E quando acontece assim, a velocidade do pensamento faz alguns textos sem corpo, sem forma, sem pretensões que se dissipam antes mesmo de chegar ao papel. Não preciso que me compreenda, mas é como se durante os silêncios, eu tecesse de algum retalho mínimo – nosso – o desejo de te dizer do encanto, que ainda não virou palavra porque não quero me surpreender. Eu não te escrevi lindamente cartas entusiastas. Eu não te fiz um texto cheio de cor e de som. Eu ainda não sentei para pensar que sim, se não uma surpresa, você é uma válida descoberta que se manteve interessante desde o caminho do olá até ontem à noite, quando você não estava presente e me perguntaram por que tão poucas palavras. Eu não soube responder. Sopraram que deveria ser o coração. Provavelmente o coração. E entre amigos, eu ensaiei falar sobre você. De como a cidade e as linhas e também as coincidências, promovem os encontros e ou as despedidas.

Então deve ser mesmo o coração. Coração, moço, que vai além dos amantes e do efêmero. Coração de gente jovem. Coração de homem que se deixa levar por gentileza. Sem exigir tanto, porque tanto é desnecessário. De tanto procurar significados, percebi depois que arquitetar qualquer justificativa para aliviar o desconforto do não saber, é tentar em vão, viver acomodado. Na zona de conforto, onde o sim é sim. O não é não. E onde tudo permanece em ordem sem nunca ter saído da ordem. Ordem não há, saiba. A memória é recente e talvez eu não saiba dizer tudo o que eu quero e não é por não ter o que dizer, é por não saber classificar e escrever na afobação da temperatura do impulso. Uma das minhas piores liberdades. Deve ser mesmo o coração, então. Coração que foge do óbvio do ‘eu te quero’ entusiasta. Coração leviano, que aceita mais um para que a viagem não seja tão monótona. Coração do querer bem que não é só festa que não é só paz. Que não é só dor. Coração das letras. E dos parágrafos. Confusões nem tão confusas porque com o tempo, a gente percebe que é no simples onde o fluxo faz mais sentido. E sentido, você sabe, não há.

Eu sentei para te escrever na sala de espera da oftalmologista. Eu esperei mais de uma hora e escrevi apenas uma frase. Retomei a escrita no trânsito que me prendeu por volta de quarenta minutos e mais uma frase eu consegui te escrever. De noite, já bem casando, esperei por um amigo chegar pouco mais de meia hora e tentei retomar as palavras e não consegui continuar. Você me intimida. Me encanta. Você que eu não conheço. Que de nada eu sei. Você me instiga. Me coloca em estado de alerta não por me oferecer perigo, mas por ser um mistério. Você talvez não seja um mistério para mim, mais tarde eu vou compreender. Sou um homem que sonha, mas os pés descalços gostam mesmo é da terra molhada. Filho da esperança. Children of revolution. Whatever. Quando a gente complica, a gente também encerra possibilidades. E eu me deixo levar, sem muito sentido, sem a preocupação com o sentido, mas atento ao comprometimento porque quando duas pessoas se encontram, sejam as vias quais forem, elas estabelecem de imediato algum laço de afinidade que se alimentado, gestação natural e responsável, vira compromisso. Não de contas pagas, satisfações ou papai e mamãe. Mas o compromisso com o sagrado, o secreto e a confiança do outro. É mais simples do que parece. E eu acabei de perceber que dei nome ao que ainda não tinha.

Eu não sou um personagem de filme.

Eu tenho alguma inteligência, que paga umas contas e faz os amigos sorrirem.

Eu erro muito. E me sinto muito à vontade para recomeçar.

Eu não gosto de teias.

Eu já gosto de você.